N.º 1 (1991): O PÓS-MODERNISMO NA LITERATURA EUROPEIA

No nº 1 do boletim Dedalus, publicado em 1988, pode ler-se, em certo passo da nota introdutória que então assinei: «A A.P.L.C. (…) entende-se como o lugar de convergência dos múltiplos domínios por onde hoje em dia se alargam os estudos consagrados à actividade literária, da história à teoria, da poética à tradução, da metodologia às pragmáticas do texto.» Esse primeiro número permaneceu único, porque justamente se fez entretanto sentir a necessidade de criar um corpo concreto que englobasse as manifestações desse fenómeno, a que conferências, colóquios e intervenções diversas de colegas nacionais e estrangeiros foram progressivamente dando forma. Assim, o boletim Dedalus deu lugar à revista Dedalus, cujo primeiro número agora surge, e que entendemos como concretização de um dos sectores mais significativos do trabalho efectivo da A.P.L.C. durante o segundo mandato da sua primeira Direcção, estando já no nosso espírito apresentá-lo desde há algum tempo, conforme anunciámos durante a realização do nosso I Congresso em 1989.
Assim a Dedalus surge agora, idêntica nos seus pressupostos, mas diferente no seu aspecto e nas suas ambições. Apostando no trabalho organizado (publicação das Actas do Colóquio sobre «O pós-Modernismo na Literatura Europeia», por nós promovido em colaboração com o instituto de Estudos Europeus da Universidade Nova de Lisboa), assim como na colaboração avulsa (mas solicitada) de diversos universitários portugueses e estrangeiros, marcando a presença da Universidade de Lisboa (à qual pertencem todos os membros da actual Direcção da A.P.Ç.C.) mas abrindo-se às várias outras Universidades do país e, sobretudo, alargando a sua área de publicação a muitos colegas de Universidades de todo o mundo, esta é, a partir de agora, a nossa Revista Portuguesa de Literatura Comparada.
Não é esta ainda a Dedalus que nós queremos; não está completa, não inclui as secções de recensão e de noticiário que para ela de futuro pretendemos; mas porque não visamos a perfeição imediata, e apenas queremos, modestamente, e na medida dos vários possíveis que nos condicionam a actuação, criar um órgão de utilidade associativa de características científicas e internacionais — o que já não é visar pouco —, apresentamos nestas páginas a contribuição para esse objectivo que o nosso esforço conseguiu por agora realizar.
Essa contribuição reflecte a nossa orientação persistente de recolha de trabalhos de perspectivas diferenciadas, que possam, por um lado, dar a media dos modos vários por que a Literatura Comparada é entendida peal comunidade que a pratica, e que, por outro lado, permitam um diálogo implícito e estimulante, uma ostentação que a própria revista assume de maneira polémica e questionadora, num reconhecimento da diferença e do seu complemento articulador essencial, o debate, como componente fundamental da actividade e do discurso académicos dos nossos dias, e nomeadamente dos que assumem o trabalho especificamente comparatista.
O resultado passa agora a publicar-se com uma regularidade anual, e pretende-se revelador de um projecto que é polivalente, e que, radicando da Universidade Portuguesa, cujo labor pretende afirmar e difundir (razão da publicação indiferenciada dos estudos quer em língua portuguesa quer nas línguas de trabalho internacional, de acordo com o desejo e a intenção dos seus autores), reconhece só ser possível numa perspectiva que ultrapasse as limitações nacionalistas, sempre que estas se revelem empobrecedoras e restritivas.
De facto, o mundo cada vez é mais pequeno, e a Literatura cada vez maior; trabalhamos por vezes de modo semelhante aos que estão longe, tanto quanto nos diferenciamos, em certos casos, dos que vivem perto de nós. Reconhecer isso é reconhecer que a vida universitária, como todas as manifestações culturais (nas quais a Literatura se inclui), participa de uma rede de sistemas que, não anulando a sua implicação nacional, só efectivamente encontram o lugar adequado (e produtivo) da sua determinação quando situados no conjunto total a que pertencem, e cuja consideração global, acentuando a sua formação múltipla e complexa, lhes permite decerto definir afinal com mais rigor e garantia a medida da sua condição de singularidade, sempre necessariamente encarada em processo de comunicação e, por conseguinte, de irrecusável abertura e transformação.
Universidade de Lisboa, 6 de Outubro de 1991
Maria Alzira Seixo